30 de setembro de 2008

Do fundo do baú.

[...]
I drank too much last night, got bills to pay
My head just feels in pain
I missed the bus and there'll be hell today
I'm late for work again
And even if I'm there, they'll all imply
That I might not last the day
And then you call me and it's not so bad
It's not so bad and

I want to thank you
For giving me the best day of my life
Oh just to be with you
Is having the best day of my life

Push the door, I'm home at last
And I'm soaking through and through
Then you handed me a towel and all I see is you
And even if my house falls down now
I wouldn't have a clue
Because you're near me.
[...]


[Dido]

29 de setembro de 2008

POST DERRAMADO

arrependido da leseira lúdico-amorosa-salineira que preparou lá no word, ele prefiro não postá-la, digo, o tio. Bartleby, o escriturário, perturba o juízo dele, cond´eu...

brogueiro é que nem cachaceiro, descuidou ele zoneia com horrendas declarações públicas _essa é a graça de não levar-se a sério, beber ao vivo, morrer se for preciso, neo-rondon das novas selvas, amarais neto do aperto nacionalista, taz-brincano?, issaqui, lobantunes, é apenas peixassado na George Foreman do conhecimento do inferno... O tio não come, engole farelos e trocadilhos-alpistes, q fastio da peste essas mulerez!


[XICO SÁ]

26 de setembro de 2008

'Caia na realidade, fada.'

Lamente longe por favor,
Chore sem fazer barulho.
Cazuza


Hoje eu descobri que essa relação nunca permitiu plural. Não existe a nossa música, o que existe é aquela musica que me lembra você. Não existe o nosso lugar, existe a sua cama, aquela que às vezes você me permite deitar para o seu prazer. E eu tentei transformar essa realidade na minha, ver com seus olhos pra entender suas loucuras, reprimir meu lado egoísta. Troquei a Nayara reticente pela Nayara que termina as frases. Exercitei a minha paciência pela esperança de um dia te ter por inteiro. Me forcei a ser madura e aceitar não cobrar, não me importar e não dar chilique como se fosse natural. Não é natural! Eu não sei não ter ciumes, não sei sorrir para uma decepção, não sei dividir. E já tentei todos os truques pra não demonstrar minha fraqueza, só pra tentar te ter mais um pouquinho.
Eu nunca quis te mudar, afinal de contas, foi por esse seu jeito despreocupado, virado e tarado que eu me apaixonei. Mas sinto falta de algumas certezas. Não sou segura o suficiente pra ir embora e te deixar dormindo. Morro de medo de você acordar e nem ao menos lembrar com quem esteve. E odeio quando você não responde as minhas mensagens ou não me atende, essas coisas me diminuem. Me sinto colocada na vala comum, na gaveta das 'dou uns pegas'. Queria poder falar na NOSSA música, da NOSSA aventura no banco de trás de um carro em plena contorno e de todas as coisas que já fizemos juntos.
Mas ao invés de tentar me convencer de que eu não sou só mais uma, você insiste em me lembrar o tempo todo que esse sentimento é só meu, e que a sua vida não tem lugar pra mais um.
Parabéns, hoje você me convenceu.


Sabe qual é meu sonho secreto? Que um dia você perceba que poderia ter aproveitado melhor a minha companhia. Que um dia imagine o quanto teria sido ótimo estar ao meu lado, mesmo quando eu estava gripada. No entanto, sei que você está a cada dia que passa mais fugidio. E eu me limito a me surpreeender com as circunstâncias da vida. Que me levaram a viver esse papel: o da mulher que quer mais um pouquinho. Constrange-me existir nesse personagem Chico Buarque, dolorida, bonita sendo assim, meio tonta, meio insistente, até meio chata. Nunca precisei aborrecer ninguém antes, então atuo por instinto, cansando-me facilmente. E que fique claro que não é por estar você dessa forma, tão esquivo, que o desejo tanto. Desejo-o porque desejo. Estúpida. Latina. Bethânia. Ainda creio que você, quando eu menos esperar, possa me chegar com um VERSO DE ATITUDE.

Fernanda Young - Aritmetica

Cazuza. Cazuza. Cazuza.

Eu, eu agradeço, Senhor
Eu, eu agradeço, Senhor

Pois me criei
Esta criança que eu sempre hei de ser
Por outros seres e desejos
Vivos nas estrelas
Por ser um rei
E não ter que governar a vida

Agradeço por ter desobedecido
Por ter cuspido no teu altar sagrado
E por saber que nunca vou ter fé
E vou rir só com um canto da boca

Eu, eu agradeço, Senhor
Eu, eu agradeço, Senhor

Meu coração vai filtrar todo o ódio
Como um fígado, e vencer o tédio
E na cabeça a dúvida e o medo
São os amigos que vão me manter são

Eu, eu agradeço, Senhor
Ou, ou, ou o que mais então?

Se eu vejo a luz e vivo a escuridão
E não estou pronto pro grande momento
Se eu vejo a luz e vivo a escuridão
Agradeço mas não me lamento
Por negar também a tua presença
Peço licença pra cantar o amor
E não esperar jamais a recompensa

23 de setembro de 2008

Choro mesmo.

Cá entre nós: fui eu quem sonhou que você sonhou comigo?
Ou teria sido o contrário?
Sonhei que você sonhava comigo. Mais tarde, talvez eu até ficasse confuso, sem saber ao certo se fui eu mesmo quem sonhou que você sonhava comigo, ou ao contrário, foi quem sabe você quem sonhou que eu sonhava com você. Não sei o que seria mais provável. Você sabe, nessa história de sonhos — falo o óbvio —, nunca há muita lógica nem coerência. Além disso, ainda que um de nós dois ou os dois tivéssemos realmente sonhado que um sonhava com o outro, também é pouco provável que falássemos sobre isso. Ou não? Sei que o que sei é que, sem nenhuma dúvida:
Sonhei que você sonhava comigo. Certo? Não, talvez não esteja nada certo. Também não era isso o que eu queria ou planejava dizer. Pelo menos, não desse jeito embaçado como uma vidraça durante a chuva. Por favor, apanhe aquele pequeno pedaço de feltro que fica sempre ali, ao lado dos discos. Agora limpe devagar a vidraça — quero dizer, o texto. Vá passando esse pedaço de feltro sobre o vidro, até ficar mais claro o que há por trás. Lago, edifício, montanha, outdoor, qualquer coisa. Certamente molhada, porque só quando chove as vidraças embaçam. Será? Não tenho certeza, mas o que quero dizer, disso estou certo, começa assim:
Sonhei que você sonhava comigo. Agora penso que é também provável que — se realmente fui mesmo eu a sonhar que você sonhou comigo; e não o contrário — eu não estivesse sonhando. Nada de sono, cama, olhos fechados. É possível que eu estivesse de olhos abertos no meio da rua, não na cama; durante o dia, não à noite — quando aconteceu isso que chamo de sonho. Embora saiba que — se foi dessa forma assim, digamos, consciente — então não seria correto chamá-la de sonho, essa imagem que aconteceu —, mas de imaginação ou invento até mesmo delírio, quem sabe alucinação. Mas não, não é isso o que quero contar, O que quero contar, sei muito bem e sem nenhuma hesitação, começa assim:
Sonhei que você sonhava comigo. Parece simples, mas me deixa inquieto. Cá entre nós, é um tanto atrevido supor a mim mesmo capaz de atravessar — mentalmente, dormindo ou acordado — todo esse espaço que nos separa e, de alguma forma que não compreendo, penetrar nessa região onde acontecem os seus sonhos para criar alguma situação onde, no fundo da sua mente, eu passasse a ter alguma espécie de existência. Não, não me atrevo. Então fico ainda mais confuso, porque também não sei se tudo isso não teria sido nem sonho, nem imaginação ou delírio, mas outra viagem chamada desejo. Verdade eu queria muito. Estou piorando as coisas, preciso ser mais claro. Começando de novo, quem sabe, começando agora:
Sonhei que você sonhava comigo. Depois que sonhei que você sonhava comigo, continuei sonhando que você acordava desse sonho de sonhar comigo — e era um sonho bonito, aquele —, está entendendo? Você acordava, eu não. Eu continuava sonhando, mas na continuação do meu sonho você tinha deixado de sonhar comigo. Você estava acordado, tentando adequar a imagem minha do sonho que você tinha acabado de sonhar à outra ou à soma de várias outras, que não sei se posso chamar de real, porque não foram sonhadas. Mas, se foi o contrário, então era eu, e não você, quem tentava essa adequação — nessa continuação de sonho em que ou eu ou você ou nós dois sonhamos um com o outro. Nos víamos? Quase consegui, agora. Preciso simplificar ainda mais, para começar de novo aqui:
Sonhei que você sonhava comigo. Depois, fiquei aflito. E quase certo de que isso não tinha acontecido. O que aconteceu, sim, é que foi você quem sonhou que eu sonhava com você. Mas não posso garantir nada. Sei que estou parado aqui, agora, pensando todas essas coisas. Como se estivesse — eu, não você — acordando um pouco assustado do bonito que foi ter tido aquele sonho em que você sonhava comigo. Tão breve. Mas tudo é muito longo, eu sei. Estou ficando cansativo? Cansado, também. Está bem, eu paro. Apanhe outra vez aquele pedaço de feltro: desembace, desembaço. Choveu demais, esfriou. Mas deve haver algum jeito exato de contar essa história que começa e não sei se termina ou continua assim:
Sonhei que você sonhava comigo. Ou foi o contrário? Seja como for, pouco importa: não me desperte, por favor, não te desperto.

[Caio F. Abreu]

22 de setembro de 2008

Anotações insensatas

Mas não se pode agir assim, a amiga avisou no telefone. Uma pessoa não é um doce que você enjoa, empurra o prato, não quero mais. Tentaria, então, com toda a delicadeza possível, sem decidir propriamente decidiu no meio da tarde — uma tarde morna demais, preguiçosa demais para conter esse verbo veemente: decidir. Como ia dizendo, no meio da tarde lenta demais, escolheu que — se viesse alguma sofreguidão na garganta, e veio — diria qualquer coisa como olha, tenho medo do normal, baby.

Só que, como de hábito, na cabeça (como que separada do mundo, movida por interiores taquicardias, adrenalinas, metabolismos) se passava uma coisa, e naquele ponto em que isso cruzava com o de fora, esse lugar onde habitamos outros, começava a região do incompreensível: Lá, onde qualquer delicadeza premeditada poderia soar estúpida como um seco: não. E soou, em plena mesa posta.

Tanto pasmo, depois. Sozinho no apartamento, domingo à noite. Todas as coisas quietas e limpas, o perfume adocicado das madressilvas roubadas e o bolo de chocolate intocado no refrigerador — até a televisão falar da explosão nuclear subterrânea. Então a suspeita bruta: não suportamos aquilo ou aqueles que poderiam nos tornar mais felizes e menos sós. Afirmou, depois acendeu o cigarro, reformulou, repetiu, acrescentou esta interrogação: não suportamos mesmo aquilo ou aqueles que poderiam nos tornar mais felizes e menos sós? Não, não suportamos essa doçura.

Puro cérebro sem dor perdido nos labirintos daquilo que tinha acabado de acontecer. Dor branca, querendo primeiro compreender, antes de doer abolerada, a dor. Doeria mais tarde, quem sabe, de maneira insensata e ilusória como doem as perdas para sempre perdidas, e portanto irremediáveis, transformadas em memórias iguais pequenos paraísos-perdidos. Que talvez, pensava agora, nem tivessem sido tão paradisíacos assim.

Porque havia o sufocamento daquela espécie de patético simulacro de fantasia matrimonial provisória, a dificuldade de manter um clima feito linha esticada, segura para não arrebentar de súbito, precipitando o equilibrista no vazio mortal. Cheio de carinho, remexeu no doce, sem empurrar o prato. Preferia a fome: só isso. Pelo longo vício da própria fome — e seria um erro, porque saciar a fome poderia trazer, digamos, mais conforto? — ou de pura preguiça de ter que reformular-se inteiro para enfrentar o que chamam de amor, e de repente não tinha gosto?

De onde vem essa iluminação que chamam de amor, e logo depois se contorce, se enleia, se turva toda e ofusca e apaga e acende feito um fio de contato defeituoso, sem nunca voltar àquela primeira iluminação? Espera, vamos conversar, sugeriu sem muito empenho. Tarde demais, porta fechada. Sozinho enfim, podia remexer em discos e livros para decidir sem nenhuma preocupação de harmonia-com-o-gosto-alheio que sempre preferira um Morrison a Manuel Bandeira. Sid Vicious a Puccini. A mosca a Uma janela para o amor, sempre uma vodca a um copo de leite: metal drástico. Era desses caras de barba por fazer que sempre escolherão o risco, o perigo, a insensatez, a insegurança, o precário, a maldição, a noite — a Fome maiúscula. Não a mesa posta e farta, com pratos e panelas a serem lavados na pia cheia de graxa — mas um hambúrguer qualquer para você que escrevo. Mas os escritores são muito cruéis, você me ama pelo que me mata com coca-cola no boteco da esquina, e a vida acontecendo em volta, escrota e nua.

Não muito confuso, assim confrontado com sua explícita incapacidade de lidar com. A palavra não vinha. Podia fazer mil coisas a seguir. Mas dentro de qualquer ação, dentes arreganhados, restaria aquela sua profunda incapacidade de lidar com. Um instante antes de bater outra, colocar uma velha Billie Holiday e sentar na máquina para escrever, ainda pensou: gosto tanto de você, baby. Só que os escritores são seres muito cruéis, estão sempre matando a vida à procura de histórias. Você me ama pelo que me mata. E se apunhalo é porque é para você, para você que escrevo — e não entende nada.

[C.F.A.]

21 de setembro de 2008

Dói.















É de lágrima

Que faço o mar pra navegar
Vamo lá!
Eu não vi, não, final
Sei que o daqui
Teimou de vir, tenaz assim
Feito passarim


É de mágica
Que eu dobro a vida em flor
Assim!
E ao senhor de iludir

Manda avisar, que esse daqui
Tem muito mais amor pra dar.

19 de setembro de 2008

O amor é uma doença

Eu não sei guardar coisas. Se eu compro chocolates, como todos no mesmo dia.
Se eu compro balas, chicletes, devoro todos em minutos, compulsivamente.
Detesto saber que algo me espera, quero acabar logo com aquilo.
Não sei lidar com a responsabilidade da felicidade. A felicidade guardada na bolsa ou na vida.
Eu tenho um homem lindo me esperando essa hora, e eu quero com todas as células do meu corpo ir ao encontro dele. Mas eu não sei lidar com tanta felicidade, por isso estou planejando a morte dele.
Estou planejando matá-lo com minha estupidez, quero que ele morra fulminado pelas minhas armas de boicote.
Quero que ele perceba o quanto sou chata, ciumenta, louca e doente. E que ele enjoe logo da minha cara abatida de intensidade. Que ele pegue logo bode do meu cansaço em viver tanto, porque vivo muito mesmo quando estou deitada olhando para um ponto fixo.
É tão cansativo ser eu mesma com todos os meus medos e neuroses, e quero que ele sinta o fardo do meu peso.
Morra e me liberte dessa alegria incontrolável. Passe desta para uma melhor, porque eu sou um lixo.
Eu lembro daquele conto da Clarice em que a garotinha ruiva guardava os contos para ler depois, porque queria prolongar o mistério da felicidade.
Pois eu quero mais é botar fogo em todos os contos de felicidade que a vida escreve para mim, porque por alguma razão maluca a felicidade me escraviza, me paralisa, me faz ficar triste.
Eu olho para você e tenho tanta, mas tanta alegria em saber que você existe, que sinto ódio. Ódio de eu não mais esperar por você.
O sentido da minha vida era encontrar você. O motivo para eu seguir adiante nos corredores escuros e bater em portas obscuras, era a sua busca.
Agora que você está sentado numa sala clara e óbvia, não preciso mais me enfiar em buracos. Mas os buracos eram a única trilha que eu conhecia.
Você me soltou na atmosfera e eu estou voando. E eu sinto saudades do buraco, da espera, da angústia.
Eu sinto falta de olhar triste para o espelho e me sentir metade. Agora que eu tenho você, nem perco mais meu tempo olhando para o espelho, porque só tenho olhos para você.
Você me roubou de mim mesma. E eu sou tão ciumenta que estou com ciumes de mim. Você me tirou da minha vida incompleta. E me transformou numa completa idiota.
O amor é uma doença. Eu sinto náuseas, febres, dores musculares. Eu acordo assustada no meio da noite. Eu choro à toa.
Eu estava do lado da sujeira, eu era a outra, eu estava por dentro do crime.
Você me fez sentir um mundo limpo, verdadeiro e eterno. E esse mundo é tão novo pra mim, que eu te odeio. Que eu estou pequena nele, e preciso de você o tempo todo para me abraçar e dizer que está tudo bem.
E quando você não está por perto, eu caio. Porque não sei nada desse mundo de alegrias e coisas bonitas.
Você não me deu saída. Você transformou todas as vozes que me davam escapatórias para outros corredores, em sons sem lábia. Minhas saídas perderam as escadas escuras e charmosas, porque você lavou meu chão de imundícies com amaciante Fofo.
Se eu tentar fugir, escorrego no perfume da minha nova vida. A nova vida que não sei viver. A nova vida que quero viver ao seu lado. Ao lado do homem que eu odeio porque nunca amei tanto.
Ao lado da felicidade que eu odeio porque se ela acabar, não sei mais se consigo voltar pra casa. E nem se quero.
Era eu, entende? Era eu que me atracava com o lado errado da vida para estar sempre certa. Era eu a resposta para todas as perguntas que ninguém tem coragem de perguntar. Sim, o mundo é imperfeito, as pessoas traem, o amor não existe, seu marido me come, seu namorado me come, o mundo quer me comer enquanto você borda seu laço cor-de-rosa.
Agora eu estou aqui, inconformada com o seu passado, querendo matar suas lembranças. Com ciumes do seu silêncio porque ele está com você há mais tempo do que eu e eu tenho medo do quanto ele te consome, com ciumes do seu sono porque ele te leva do meu foco.
Com raiva da sua importância porque ela me congela, com raiva do tempo que não dura para sempre quando você me olha sabendo das minhas loucuras e ainda assim me amando.
Agora eu estou aqui, querendo que todos os amores do mundo durem para sempre, e que nenês nasçam, e que árvores cresçam e que garoras vagabundas não nos invejem e que os desejos das nossas sombras não nos traia.
Agora eu estou aqui, de quatro, de lingua no chão, te odiando muito, virando a cara, socando você, cuspindo em você, te tratando mal, tudo isso porque não sei lidar com o mundo girando na minha barriga, a tontura do amor, o enjôo do vício em você, a dor do músculo quando me separo.
Pode parecer maluco, mas todas as minhas súplicas para que você desista de mim, é um jeito maluco de pedir que você não desista nunca, pelo amor de Deus.

[Tati Bernardi]

18 de setembro de 2008

Prazer pela metade

Não há nada que me deixe mais frustrada do que pedir sorvete de sobremesa, contar os minutos até ele chegar e aí ver o garçom colocar na minha
frente uma bolinha minúscula do meu sorvete preferido - uma só. Quanto mais
sofisticado o restaurante, menor a porção da sobremesa. Aí a vontade que dá é de passar numa loja de conveniência, comprar um litro de sorvete bem
cremoso e saborear em casa com direito a repetir quantas vezes a gente
quiser, sem pensar em calorias, boas maneiras ou moderação.

O sorvete é só um exemplo do que tem sido nosso cotidiano. A vida anda cheia de meias porções, de prazeres meia-boca, de aventuras pela metade. A gente sai pra jantar, mas come pouco. Vai à festa de casamento, mas resiste
aos bombons. Conquista a chamada liberdade sexual, mas tem que fingir que é
difícil (a imensa maioria das mulheres continua com pavor de ser rotulada de 'fácil'). Adora tomar um banho demorado, mas se contém pra não desperdiçar os recursos do planeta. Quer beijar aquele cara 20 anos mais novo, mas
tem medo de fazer papel ridículo. Tem vontade de ficar em casa vendo um
DVD, esparramada no sofá, mas se obriga a ir malhar. E por aí vai.

Tantos deveres, tanta preocupação em 'acertar', tanto empenho em
passar na vida sem pegar recuperação... Aí a vida vai ficando sem tempero,
politicamente correta e existencialmente sem-graça, enquanto a gente
vai ficando melancolicamente sem tesão. Às vezes, dá vontade de fazer tudo
'errado' - deixar de lado a régua, o compasso, a bússola, a balança e os 10 mandamentos. Ser ridícula, inadequada, incoerente e não estar nem aí pro que dizem e o que pensam a nosso respeito. Recusar prazeres incompletos e meias porções.

Até Santo Agostinho, que foi santo, uma vez se rebelou e disse uma frase mais ou menos assim: 'Deus, dai-me continência e castidade, mas não agora'.
Nós, que não aspiramos à santidade e estamos aqui de passagem, podemos (devemos?) desejar várias bolas de sorvete, bombons de muitos sabores,
vários beijos bem dados, a água batendo sem pressa no corpo, o coração saciado. Um dia a gente cria juízo. Um dia. Não tem que ser agora. Por
isso, garçom, por favor, me traga: cinco bolas de sorvete de coco, um sofá
pra eu ver 10 episódios do 'Law and Order', uma caixa de trufas bem macias e o
Clive Owen embrulhado pra presente - não necessariamente nessa ordem.
Depois a gente vê como é que faz pra consertar o estrago.


[Leila Ferreira]

Eu estrago tudo, SEMPRE.

Eu tenho uma capacidade muito grande de estragar as coisas! Isso não é de agora. Vem de muito tempo. Não sei se isso é uma coisa de superego, id, subconsciente, doidice, bloqueio, fuga! Quando tudo ta fluindo, dando certo. Perfeita harmonia. Uma felicidade que chega até a ser irritante. Eu consigo estragar. Quase inacreditável. Às vezes com atitudes que nunca foram minhas. Coisas que nem fazem parte da minha personalidade. Do meu caráter ou de mim! De dentro de mim. Não. Não são. Não tenho a menor idéia de onde elas surgem. Isso me assusta. Imagine os outros. As pessoas que nem me conhecem. Ou as que tão começando a conhecer. Bloqueio? Quando tudo ta dando certo você vai lá e estraga porque tem algum bloqueio, algum medo das conseqüências que a concretização daquilo possa trazer. Conseqüências que podem ser maravilhosas, mas você teima em não conseguir alcança-las. Fuga? Disso mesmo. Fugir de compromissos com essas atitudes que até você mesma se assusta analisando depois. Não consigo me entender. Imagina almejar que outras pessoas o façam. Completo desabafo de uma mulher (?) que sente sim. Eu achava que não era capaz de sentir coisas bacanas por cúmplices, companheiros ou parceiros. Mas eu sei sim. Tô viva. Só preciso aprender a não estragar o que pode ser muito mágico. Às vezes eu só sigo o que meu coração manda. Mas no final parece atitude de uma desesperada adolescente imatura e impulsiva. No mínimo ridículo.

Se te canso, se te confundo, se te faço me odiar é porque não sei me traduzir. Ou desiste de me entender ou desiste de mim, não há outro caminho. Ou se houver ninguém nunca tentou...

Desabafo das nove da manhã.

Mania de só querer o impossível. Puta falta de comodismo.

17 de setembro de 2008

Despedida

E no meio dessa confusão alguém partiu sem se despedir; foi triste. Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval — uma pessoa se perda da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. É melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito — depois apenas aconteceu que não se encontraram mais. Eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado — sem glória nem humilhação.

Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.

E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida; que a lembrança deles nos faz sentir maior a nossa solidão; mas que essa solidão ficou menos infeliz: que importa que uma estrela já esteja morta se ela ainda brilha no fundo de nossa noite e de nosso confuso sonho?

Talvez não mereçamos imaginar que haverá outros verões; se eles vierem, nós os receberemos obedientes como as cigarras e as paineiras — com flores e cantos. O inverno — te lembras — nos maltratou; não havia flores, não havia mar, e fomos sacudidos de um lado para outro como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil.

Ah, talvez valesse a pena dizer que houve um telefonema que não pôde haver; entretanto, é possível que não adiantasse nada. Para que explicações? Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes; o silêncio torna tudo menos penoso; lembremos apenas as coisas douradas e digamos apenas a pequena palavra: adeus.

A pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo.

[Rubem Braga]

15 de setembro de 2008

Sede

[...]
Que coisas são essas que me dizes sem dizer, escondidas atrás do que realmente quer dizer?
Tenho me confundido na tentativa de te decifrar, todos os dias. Mas confuso, perdido, sozinho, minha única certeza é que cada vez aumenta ainda mais a minha necessidade de ti. Torna-se desesperada, urgente. Eu já não sei o que faço. Não sinto nenhuma outra alegria além de ti.
Como pude cair assim nesse fundo de poço? Quando foi que me desequilibrei? Não quero me afogar: Quero beber tua água. Não te negues, minha sede é clara.
[...]


[C.F.A.]

10 de setembro de 2008

Email pra Talita. nº 2

Tah,

só pra te contar em que ponto da montanha russa anda a minha vida.
[E eu sei que você não perguntou, mas como meu salário de estagiária não é o suficiente pra pagar um terapeuta, eu alugo meus amigos mesmo.
'O apreço não tem preço.']

Semana passada recebi uma proposta indecentíssima de 'viver uma porra loucagem'.
Mais do que depressa a minha metade descolada e auto-suficiente disse sim, mas foi calada pela outra metade, a que ainda traz consigo todos os sonhos da quando brincavamos de casinha no pátio do FF ou no quintal da Vó Detinha.

As coisas vão indo bem por aqui. Trabalho e facul estão cada vez mais interessantes.
[certo que se eu quisesse me aprofundar tanto em sociologia, faria logo ciencias socias. rs. Mas tudo bem, daqui a pouco acaba a fase da teoria, espero.]
Não tenho uma rotina massante, mas às vezes ela me sufoca. Se eu pudesse pedir a Deus alguma coisa, pediria mais uma hora de almoço, um sofá confortável do lado da minha mesa e o sagrado direito a siesta.
Tem hora que me bate uma saudade danada de morar pertinho de todo mundo, onde eu posso acordar as 6:55 pra chegar do outro lado da cidade as 7, pracinha do hospital, cafézinho na vó, clube, sino da matriz, feriados com procissões e um grande etc.
Mas na mesma hora eu penso que BH às vezes fica pequena pra mim, pra minha vontade de fazer tudo ao mesmo tempo, estar em todos os lugares, visitar todos os museus, ler todos os livros e saber tudo de tudo.
[Sim, tenho complexo de Lex Luthor.]
O que aquieta meu coração é a certeza do meu alicerce. Oliveira é a base, a pista do aeroporto que o avião da minha vida decola. Viajo, cresço, experimento, aprendo, canso, sinto falta, choro e volto. E tudo está lá, do jeitinho que eu gosto, tudo que eu preciso pra descansar para a próxima viagem.

Que graça teria a vida sem a dorzinha da saudade, não?


Olha, Tah,
estou exigindo uma visita sua aqui. Pra gente sair, sambar, beber, rir, perder ônibus.
Por mais que eu tente, é impossível criar laços de amizade sincera em cidade grande. Até porque, a minha metade que traz os sonhos de quando brincavamos no pátio do FF não me deixa confiar em quem eu conheci depois da minha primeira década de vida.

Só pra finalizar, sobre o que eu resolvi da proposta.
Aceitei.
Pulei de ponta e azar se a piscina for rasa ou não tiver água.
O friozinho na barriga da queda vale qualquer testa quebrada.

Agora é a sua vez,
sua vida, a quantas anda? Abra seu coração para que eu não me ache tão egocentrica.


Saudade?
nada... tem só uns 5 anos que eu não te vejo...

Bjos
Nayara

8 de setembro de 2008

Amén, Xico Sá

Nossa Sra. dos que Amam Sozinho, perdoa-me pela insistência, nem mais é por tanto quere-la, é por deixar claro, nega que sopra das intimidades dessa oração, que só ela me faz passar da conta, perversa, cair no abismo mais lindo do gozo sem volta, como naquele encosto de beira de estrada, como na rodovia estrangeira de Sam Shepard, crônicas de motel, simbora

Nossa Sra. dos que só pensam Nela, cotovelos lanhados de tanta espera, tantos sustos nas ruas, nos bares, “é ela!!!”, Nossa Sra. Dos Cotovelos da Surpresa e das Janelas, cotovelos tão gastos, cinzas, peles, dobras, e tanta fome de viver aqui dentro, megalomaníaco, épico, terá sido a força dos indiferentes, meu velho Alberto Moravia?

É mesmo a paudurescência, nostalgia precoce das grandes histórias, o tempo inteiro, pensando, pensando, pensando, mas no fundo gostas!

Os joelhos lanhados pela romaria, devoção e insistência.

Nossa Sra. da Vida Alongada que consegue, nos seus exercícios de Kama Sutra, me levar à coisa mais sagrada.

Amor demorado, anjo exterminador da alcova!

Beijá-la demoradamente,como um cristão que dissolve na boca uma hóstia.

Homem-bomba que troca as 70 virgens de Alá somente por uma costela.

Lua cheia, vida crescente.

Escuto Le Déserteus, Boris Vian, leste?.

Nossa Senhora dos que sentem muito e amam sozinho, rogai por nós que recorremos a vós!

6 de setembro de 2008

Ai, ai.

-Ela é tão livre que um dia será presa.
-Mas presa por que?
-Por excesso de liberdade.
-Mas essa liberdade é inocente?
-É. Até mesmo ingênua.
-Então... por que a prisão?
-Por que liberdade ofende.


[Clarice]

4 de setembro de 2008

Cazuza mata




Cazuza mata

Se eu vou pra casa
Vai faltando um pedaço
Se eu fico, eu venço
Eu ganho pelo cansaço
Dois olhos verdes
Da cor da fumaça
E o veneno da raça
Eu mereço um lugar ao sol
Mereço ganhar pra ser
Carente profissional
Carente...
Levando em frente
Um coração dependente
Viciado em amar errado
Crente que o que ele sente
É sagrado
E é tudo piada
E é tudo piada
Eu mereço um lugar ao sol
Mereço ganhar pra ser
Carente profissional
Carente...

Se você pensa que vai fazer de mim...

Por ti chorei lágrimas de rodoviária, lágrimas com poeira de estrada perdida, lágrimas e poeira que viraram maquiagem de lama, tijolos d´alma, emendei lotações e fronteiras, gastei botas, máscaras, joelhos... e contei passos de crimes & castigos, por ti esperei em hotéis baratos do centro, porta aberta, mão no pau e faca no peito, por ti bebi como uma mosca caricata de boteco, cheirei, fumei, apaguei, fiz lirismos chinfrins em guardanapos, sempre começando assim “por ti” etc e algum verbo que representasse um esforço de hércules ou o mais puro exibicionismo de uma dor tão gasta que nem já combinava mais com os meus drinques caubói nem muito menos com as minhas elegantes vestes rotas da mendicância, ah, o seu orgulho não vale uma canção triste de Roberto ou Lupicínio.

[xico sá]