25 de junho de 2009

A outra

Paz, eu quero paz
Já me cansei de ser a última a saber de ti
Se todo mundo sabe quem te faz
chegar mais tarde
Eu já cansei de imaginar você com ela
Diz pra mim
se vale a pena, amor
A gente ria tanto desses nossos desencontros
Mas você passou do ponto
e agora eu já não sei mais...

Eu quero paz
Quero dançar com outro par
pra variar, amor

Não dá mais pra fingir que ainda não vi
As cicatrizes que ela fez
Se desta vez
ela é senhora deste amor
Pois vá embora, por favor
Que não demora pra essa dor
sangrar.

[Marcelo Camelo]

19 de junho de 2009

el juego en que andamos

Si me dieran a elegir, yo eligiría
esta salud de saber que estamos muy enfermos,
esta dicha de andar tan infelices.

Si me dieran a elegir, yo eligiría
esta inocencia de no ser un inocente,
esta pureza en que ando por impuro.

Si me dieran a elegir, yo eligiría
este amor con que odio,
esta esperanza que come panes desesperados.

Aquí pasa, señores,
que me juego la muerte.

[ Juan Gelman ]

Meu amor, minha flor, minha menina...

Meu amor minha flor minha menina
Solidão não cura com aspirina
Tanto que eu queria o teu amor

Vem me trazer calor, fervor, fervura
Me vestir do terno da ternura
Sexo também é bom negócio
O melhor da vida é isso e ócio
Isso e ócio

Minha cara, minha Carolina
A saudade ainda vai bater no teto
Até um canalha precisa de afeto
Dor não cura com penicilina

Meu amor minha flor minha menina
Tanto que eu queria o teu amor
Tanto amor em mim como um quebranto
Tanto amor em mim, em ti nem tanto

Minha cora minha coralina
mais que um goiás de amor carrego
destino de violeiro cego

Há mais solidão no aeroporto
Que num quarto de hotel barato
Antes o atrito que o contrato

Telefone não basta ao desejo
O que mais invejo é o que não vejo
O céu é azul, o mar também

Se bem que o mar as vezes muda,
Não suporto livros de auto-ajuda
Vem me ajudar, me dá seu bem

Meu amor minha flor minha menina
Tanto que eu queria o teu amor
Tanto amor em mim como um quebranto
Tanto amor em mim, em ti nem tanto

[Zeca Baleiro]

18 de junho de 2009

Pálpebras Molhadas

...deixo você dormir profundamente, com muito gosto, e beijo seus zolhinhos só pra ver se alcanço os sonhos possíveis depois do pára-brisa ou da tormenta, colo, quero alcançá-los, mas chove perdigotos no cinesmascope, neblina na tela, avisto quase nada de Alice brincando numa neve alvissareira do rock, nem o chapeleiro aparece para dormir de touca, cafungo apenas outros sonhos de seu cangote mais lindo, donde marcha-ré, slow-motion de maré ao contrário,como lençóis artificiais de fellini, retorna minha menina, talvez no sonho que aluguei da balada do mar salgado, um sofista que caminhava como Moisés en la calle, volta para a manteiga de lata aviación dos desejos ou para o último tango com manteiga de garrafa, vem menina, talvez sem bilhete de vuelta, amém, o retorno de quem nunca devia ter partido, mas se for amor que fique até gastar o bigode de nietzsche, vixe, infindável vassoura de faxinas cujas árvores ainda choram o cabo das possíveis assepsias moralistas... ah, nega, esqueça essas filosofias baratas e madeirísticas e vamu fuder de verdade.

[Xico Sá]

LO-LI-TA [again]

"Olha, olha o que você fez, olha só como você se machucou", pois havia, eu juro, uma mancha amarela arroxeada em sua adorável coxa de ninfeta, que eu massageava e lentamente envolvia com minha manzorra cabeluda... e, como suas roupas de baixo eram tão sumárias, aparentemente nada impedia que meu musculoso polegar alcançasse o oco de sua virilha... assim como quem faz cosquinha e acaricia um bebê que se sacode de rir, apenas isso... e: “Ah, não foi nada!”, ela exclamou num tom de voz repentinamente agudo e estremeceu, contorceu-se, atirou a cabeça para trás, seus dentes mordendo o úmido lábio inferior, o rosto agora voltado para o lado – e minha boca gemente, senhores membros do júri, quase tocou seu pescoço nu enquanto eu
comprimia contra sua nádega esquerda os últimos espasmos do mais longo êxtase que qualquer homem ou monstro jamais conheceu.

[Nabokov em Lolita]

17 de junho de 2009

O dia de ontem

Mas eu te ouvia dizer que sabias ser necessário optar entre mim e ela, e que optarias por ela, por comodidade, para não te mexeres daquele canto um pouco escuro e um pouco estreito, mas teu - e que optarias por ficar comigo porque a minha loucura te encantaria e te distrairia, embora precisasses te agitar e negar e ouvir e sobretudo compreender novamente tudo todos os dias. E disseste que optavas por mim. Eu já sabia. Por isso não te disse que comigo seria mais difícil do que com ela. Porque sabias também que em todos os de repentes eu estaria abrindo as asas sobre um desconhecido talvez intangível para ti. Não dissemos, mas concordamos no silêncio cheio de livros e jornais, que querias a salvação e eu a perdição - ainda que nos salvássemos ou nos perdêssemos por qualquer coisa que certamente não valeria a pena. Nem era preciso dizer que não era preciso dizer: eu era o teu lado esquerdo e tu eras o meu lado direito: nos encontrávamos todas as noites no espaço exíguo de nosso quarto.

[Caio acaba comigo]

Delicadezas

As paredes ficam úmidas quando sentam no lugar da janela. O sol torna o musgo mais escada. Confundo a xícara de chá com o peso de tua mão. As palavras formam a boca, não o contrário. Vou dormir até mais tarde em teu rosto. Se alguém fala sem pensar, não deves pensar ao ouvir. Nem os telhados são tão parecidos quanto a gente.

[Fabricio Carpinejar]

Achei lindo.

16 de junho de 2009

15 de junho de 2009

O quereres

Onde queres revólver, sou coqueiro
E onde queres dinheiro, sou paixão
Onde queres descanso, sou desejo
E onde sou só desejo, queres não
E onde não queres nada, nada falta
E onde voas bem alto, eu sou o chão
E onde pisas o chão, minha alma salta
E ganha liberdade na amplidão

Onde queres família, sou maluco
E onde queres romântico, burguês
Onde queres Leblon, sou Pernambuco
E onde queres eunuco, garanhão
Onde queres o sim e o não, talvez
E onde vês, eu não vislumbro razão
Onde o queres o lobo, eu sou o irmão
E onde queres cowboy, eu sou chinês

Ah! Bruta flor do querer
Ah! Bruta flor, bruta flor

Onde queres o ato, eu sou o espírito
E onde queres ternura, eu sou tesão
Onde queres o livre, decassílabo
E onde buscas o anjo, sou mulher
Onde queres prazer, sou o que dói
E onde queres tortura, mansidão
Onde queres um lar, revolução
E onde queres bandido, sou herói

Eu queria querer-te amar o amor
Construir-nos dulcíssima prisão
Encontrar a mais justa adequação
Tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e de viés
E vê só que cilada o amor me armou
Eu te quero (e não queres) como sou
Não te quero (e não queres) como és

Ah! Bruta flor do querer
Ah! Bruta flor, bruta flor

Onde queres comício, flipper-vídeo
E onde queres romance, rock’n roll
Onde queres a lua, eu sou o sol
E onde a pura natura, o inseticídio
Onde queres mistério, eu sou a luz
E onde queres um canto, o mundo inteiro
Onde queres quaresma, fevereiro
E onde queres coqueiro, eu sou obus

O quereres e o estares sempre a fim
Do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal
E eu querendo querer-te sem ter fim
E, querendo-te, aprender o total
Do querer que há e do que não há em mim


[Caetano Veloso]

9 de junho de 2009

LO-LI-TA

Lolita, luz de minha vida, labareda em minha carne. Minha alma, minha lama. Lo-li-ta: a ponta da língua descendo em três saltos pelo céu da boca para tropeçar de leve, no terceiro, contra os dentes. Lo. Li. Ta.

Pela manhã ela era Lô, não mais que Lô, com seu metro e quarenta e sete de altura e calçando uma única meia soquete. Era Lola ao vestir os jeans desbotados. Era Dolly na escola. Era Dolores sobre a linha pontilhada. Mas em meus braços sempre foi Lolita.


[Vladimir Nabokov]

6 de junho de 2009

Poema LXIV

De amar mucho tienes la palabra que persuade,
la mirada que vence y que turba...
De amar mucho dejas amor en torno tuyo, el que pasa cerca
y se huele el perfume en el pecho, viene a creer que tiene la rosa dentro...

[Dulce María Loynaz]

5 de junho de 2009

Litania

Nós nunca nos realizamos.

Somos dois abismos – um poço fitando o Céu.

[Fernando Pessoa]

Agora aprende, tá?

Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que por admiração se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles. Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles. Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração. Como eles admiravam estarem juntos! Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.

[Clarice Lispector in, Para não esquecer]

4 de junho de 2009

Fala, Caio... fala por mim.

O que se pode fazer numa situação como essa — mesmo para mim, que deveria ser o dono dela, mas me recuso — a não ser esperar? Esperamos, todos. O que está lá, o que conta sobre isso e os que lêem sobre isso. Esperamos então. Horas, dias, meses, anos e anos. Ninguém sabe o quanto. Podemos nos distrair enquanto esperamos, ligar o rádio, olhar pela janela, abrir a geladeira, mastigar alguma coisa, beber mais água neste dia seco, até mesmo ligar a TV para entrar noutras histórias, falsas ou verdadeiras, mas onde aconteçam coisas, em vez de ficarmos parados nesta onde nada acontece desde as primeiras palavras. E voltar a ela como quem volta a chamar um número de telefone eternamente ocupado, só para constatar que continua ocupado e apenas para ter a sensação de não desistir. Desistir não é nobre. E arduamente, não desistimos.

[C.F.A.]

3 de junho de 2009

só pra constar

Que eu tô certa eu sei.
Fico esperando pelo dia em que vou poder te dar razão.

Vagabundo não é facil.

[...]
E no mais, tudo na mais perfeita paz. Sendo que eu assumo isso, mesmo quando se diz que já acabou, ainda quero morrer de amor.

Vá! Se arranque da minha janela. Assim é tomar a frente do Sol. Tá pensando que tudo é futebol?

Ao menos leve uma certeza, você me deixa doído. Mas só não me deixará doido, porque isso sou, isso já sou.

[Novos Baianos]

2 de junho de 2009

Caçada

Não conheço seu nome ou paradeiro
Adivinho seu rastro e cheiro
Vou armado de dentes e coragem
Vou morder sua carne selvagem

Varo a noite sem cochilar, aflito
Amanheço imitando o seu grito
Me aproximo rondando a sua toca
E ao me ver você me provoca

Você canta a sua agonia louca
Água me borbulha na boca
Minha presa rugindo sua raça
Pernas se debatendo e o seu fervor

Hoje é o dia da graça,
hoje é o dia da caça e do caçador

Eu me espicho no espaço feito um gato
Pra pegar você, bicho do mato
Saciar a sua avidez mestiça
Que ao me ver se encolhe e me atiça

E num mesmo impulso me expulsa e abraça
Nossas peles grudando de suor
Hoje é o dia da graça,
hoje é o dia da caça e do caçador

De tocaia fico a espreitar a fera
Logo dou-lhe o bote certeiro
Já conheço seu dorso de gazela
Cavalo brabo montado em pelo

Dominante, não se desembaraça
Ofegante, é dona do seu senhor
Hoje é o dia da graça,
hoje é o dia da caça e do caçador

[Chico Buarque]

She Loves You

She loves you, yeah, yeah, yeah
She loves you, yeah, yeah, yeah
She loves you, yeah, yeah, yeah

You think you lost your love,
Well, I saw her yesterday.
It's you she's thinking of
And she told me what to say.

She says she loves you
And you know that can't be bad.
Yes, she loves you
And you know you should be glad.

She said you hurt her so
She almost lost her mind.
But now she said she knows
You're not the hurting kind.

YOU KNOW it's up to you,
I think it's only fair,
Pride can hurt you, too,
Apologize to her

Because she loves you
And you know that can't be bad.
Yes, she loves you
And you know you should be glad.


She loves you, yeah, yeah, yeah
She loves you, yeah, yeah, yeah
With a love like that
You know you should
Be Glad!

With a love like that
You know you should
Be Glad!

[The Beatles]

1 de junho de 2009

Blair sofre como eu.

Não quer saber o que está me impedindo de sair fora? De tentar esquecer algumas coisas? Você me disse uma vez que não poderíamos ficar juntos. E eu acreditei em você. Mas cada vez que eu tento seguir em frente, você aparece, agindo como se gostasse... Talvez você só queira que eu seja uma pessoa que você possa ter quando quiser... Então olhe bem no fundo na sua alma, que sei que tem, e diga se o que sente por mim é verdadeiro. Ou se é um jogo. Se for real, daremos um jeito. Todos nós. Mas se não for, por favor, deixe-me ir...

Você só... mente

Não espero mais você, pois você não aparece
Creio que você se esquece das promessas que me faz
E depois vem dar desculpas, inocentes e banais
É porque você bem sabe
Que em você desculpo
Muitas coisas mais
O que sei somente
É que você é um ente
Que mente inconscientemente
Mas finalmente
Não sei porque
Eu gosto imensamente
De você
Invariavelmente, sem ter o menor motivo
Em um tom de voz altivo
Você quando fala mente
Mesmo involuntariamente, faço cara de inocente
Pois sua maior mentira, é dizer à gente que você não mente

[Noel Rosa]

Escapismos explícitos...

Sou a pessimista mais esperançosa que eu conheço.
O que faz de mim uma perfeita idiota!

Xico Sá diz:

[...]
É, amigos, toda vez que ouço um diplomático “estou confusa” saco logo meu velho serrote de galhas e chifres para poder, ao menos, entrar, humildemente, na porta de casa.