12 de fevereiro de 2009

O que obviamente não presta...

Preciso de atrapalhar as significâncias. O despropósito é mais saudável do que o solene. Para limpar a palavra de alguma solenidade - uso bosta. Nasci para administrar o à-toa, o em vão, o inútil. Prefiro as máquinas que servem parar não funcionar: quando cheias de areia, de formiga e musgo - elas podem um dia milagrar de flores. Também as latrinas desprezadas que servem para ter grilos dentro - elas podem um dia milagrar violetas. Senhor, eu tenho orgulho do imprestável!

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Prefiro as palavras obscuras que moram no fundo de uma cozinha – tipo borra, latas, cisco. Do que as palavras que moram nos sodalíscios – tipo excelência ,conpíscuo, majestade. Também os meus alter egos são todos borra, ciscos, pobres-diabo que poderiam morar nos fundos de uma cozinha – tipo Bola Sete, Mário Pega Sapo, Maria Pelego Preto etc. Todos bêbados ou bocós. E todos condizentes com andrajos. Um dia alguém me sugeriu que adotasse um alter ego respeitável – tipo um príncipe, um almirante, um senador. Eu perguntei: Mas quem ficará com os meus abismos se os pobres-diabos não ficarem?

[Manoel de Barros]

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